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28 fevereiro, 2008

Acabou a dívida externa?

Fonte: Radioagência NP

Cesar Sanson*

Um misto de perplexidade, surpresa e desconfiança deve ter sido a reação de muitos ao lerem a notícia estampada nas manchetes dos principais jornais do país nos últimos dias de que o Brasil zerou a sua dívida externa.

Mas como? Simples assim? Toda uma geração de militantes cresceu sob a histórica bandeira de luta do 'não à dívida externa'. O tema da dívida externa sempre foi central na agenda do movimento social brasileiro nas últimas décadas.

Um grande movimento de contestação foi organizado em torno da dívida externa – a Campanha Jubileu 2000, as pastorais realizaram uma Semana Social Brasileira sobre o tema (1998) e os movimentos sociais um Plebiscito Popular (2000). E agora recebemos a notícia, em um breve informe do Banco Central, de que o Brasil zerou a sua dívida externa. Tão simples assim? A reação mínima é de perplexidade.

Na realidade a notícia é marqueteira. A dívida externa não evaporou, continua existindo. O anúncio do Banco Central diz respeito mais a uma conta de contabilidade do que de fato ao fim da dívida externa. Em tese a dívida externa foi zerada em função de que os ativos - dinheiro, créditos, investimentos - aplicados no exterior superam o valor de todo o endividamento contraído. Ou seja, significa que o Brasil seria capaz de pagar toda a dívida externa usando só as aplicações que tem lá fora.

Entretanto essa 'matemática' é contestada. O economista Rodrigo Vieira de Ávila, da Campanha Auditoria Cidadã da Dívida vinculada à Rede Jubileu Sul Brasil destaca que “este suposto marco histórico divulgado pelo governo esconde, na realidade, uma verdadeira reciclagem do velho mecanismo de espoliação da dívida externa, com uma nova máscara: o endividamento interno”.

O suposto fim da dívida externa significa que o país deixará de pagar juros? Absolutamente. Como já se disse, a notícia - que não deixa de ser relevante – diz respeito mais a uma contabilidade de caixa e não produzirá grandes conseqüências. Entretanto, uma outra notícia na mesma semana demonstra que a situação de endividamento do governo não é tão simples assim.

A notícia de que a dívida interna brasileira se mantém acima de R$ 1,2 trilhão. Divulgada no mesmo dia em que o governo comemorou a superação do problema do endividamento externo - revela que o Brasil ainda tem muito que avançar na dívida interna, considerada o maior entrave para o equilíbrio das finanças nacional.

O valor astronômico da dívida interna fez com que apenas em janeiro o país desembolsasse o pagamento de R$ 13,4 bilhões em juros. Em um mês, com os juros da dívida, o Brasil gastou praticamente o mesmo que utiliza para bancar o Bolsa-Família durante o ano todo.

O anúncio do 'fim' da dívida externa não significa o fim do endividamento brasileiro. Estamos distantes dessa possibilidade.

26/02/08

(*) Pesquisador do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores e doutorando de Ciencias Sociais na UFPR. Esta análise foi feita em um trabalho conjunto com a equipe do Instituto Humanitas Unisinos (IHU).

Um comentário:

Anônimo disse...
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